sexta-feira, novembro 10, 2006

Violoncelo

O meu violoncelo tem o pranto que me pertence. O meu violoncelo tem as torrentes de amores e pássaros desonrientados. Mesmo sem cordas, o meu violoncelo continua a ranger a dor na madeira. E, cada corda, é açucar a jorrar da fonte. O meu violoncelo tem saudades de mim, toca por mim quando não me consigo levantar do chão e dá-me uma sonata de presente.
Não precisas falar de ti porque hoje vi-te a tocar. Transpiravas que nem a pele dourada de cavalo sobre o campo, desenfreado e selvagem. Murmuravas uma respiração tão silenciosa como a pausa da tua música. Ouvi-te, ouvi as tuas mãos, os teus dedos, os teus pulsos. Ouvi o grito a sair do teu estômago e a amarrar-se nas tuas cordas vocais até sufocar. O que ouvi foi lindo. Fixei-me na cadeira e voei até junto de ti. Irrompi nas tuas notas como véu ao vento, como liberdade total para estar onde quisesse. Viajámos juntas até onde a imaginação não criara ainda uma imagem.

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