quinta-feira, janeiro 05, 2006

Memórias poéticas (6)

"Estou a ver as duas cabeças, de perfil, iluminadas pela luz de um pequeno candeeiro de mesa de cabeceira: a cabeça de Jean-Marc, com a nuca num travesseiro; a cabeça de Chantal debruçada por cima dele a uns dez centímetros de distância.
Dizia ela: - Nunca mais tirarei os olhos de ti. Vou olhar para ti ininterruptamente.
E, depois de uma pausa: - Tenho medo quando o meu olho pisca. Medo de que, durante esse segundo em que o meu olhar se apaga, se introduza no teu lugar uma serpente, uma ratazana, outro homem.
Ele tentava erguer-se um pouco para lhe tocar com os lábios.
Ela abanava a cabeça: - Não, só quero olhar para ti.
E depois: - Vou deixar o candeeiro aceso toda a noite. Todas as noites."


Milan Kundera in A Identidade

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